“Rolês” da Copa

Publicado por: Editor Feed News
05/02/2014 10:39:50
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“Rolês” da Copa

LUIZ FLÁVIO GOMES, jurista e diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Estou noprofessorLFG.com.br

Alguns dizem que os manifestantes não passam de uns vagabundos desocupados, uns vândalos mentecaptos, que querem só destruir tudo! Outros apoiam os protestos contra a Copa do Mundo no Brasil, que já teria gasto mais dinheiro que toda verba da educação. Na verdade, depois de 514 anos, a conta está chegando! Quem só vê a superfície, não enxergará nunca a profundidade do problema, nem entenderá o complexo Brasil contemporâneo, onde o PIB representa, conforme o sociólogo Jessé Souza, quase 70% em ganhos de capital (lucros e juros), que beneficiam meia dúzia de grandes banqueiros e gigantes industriais, restando pouco mais de 30% (da renda total) para a massa salarial dos outros quase 200 milhões de brasileiros!

Nos países que praticam o elogiável capitalismo financeiro evoluído e distributivo (Dinamarca, Suécia, Coreia do Sul, Japão, Canadá, Holanda, Suíça, Finlândia etc.) a situação é invertida, visto que a grande maioria dos assalariados leva a maior parte da renda nacional. Há mais impostos, mas existe educação de qualidade para todos, saúde, transporte público etc. Nada disso acontece nos países cujas elites burguesas dominantes e seus instrumentos (agentes do Estado, mercado, democracia, manipulação da lei e da sociedade civil) seguem o capitalismo selvagem, extrativista e parasitário, moralmente degenerado e fundado no ignorantismo (3/4 dos brasileiros não sabem ler ou escrever ou não entendem o que lê ou não sabem operações matemáticas mínimas – Inaf). Nos segundos, os protestos não cessam (caso do Brasil); nos primeiros, essa etapa já virou história.

Nem com a pujante e trabalhadora classe C a desigualdade crônica no Brasil diminuiu consideravelmente. Com 0,519 pontos no Coeficiente Gini (2012), que mede a desigualdade na distribuição da renda familiar, o Brasil continua sendo um dos mais desiguais do planeta; nos últimos dez anos a melhora foi de apenas 10%. Essa desigualdade guarda simetria com nosso escabroso IDH (o Brasil está 85ª posição), que revela o índice de desenvolvimento humano com base na expectativa de vida, a educação e o PIB per capita. O Brasil, 0,73 em 2012, é um dos países de precário desenvolvimento; seu PIB per capita (em dólares, 11.303, em 2012) cresce muito devagar.

Caíram na bobagem (violência simbólica de Bourdieu) de dizer que a classe C, com renda per capita familiar de R$ 291 a R$ 1.019, seria uma nova classe média. Agora, com o consumismo se definhando, a classe C começou a entender que de classe média não tem nada, porque os capitais diferenciadores de cada uma delas são completamente desproporcionais (capital econômico, salarial, cultural, social, emocional, moral/ético, familiar etc.). Os melhores salários ou mesmo os mais cobiçados cargos públicos nunca vão para a classe C (que, diferentemente da verdadeira classe média, prioriza o trabalho em detrimento do estudo). No exame do Enem a vantagem das classes superiores é abissal.

A compensação para essa enorme frustração viria com serviços públicos de qualidade (educação, saúde, transportes etc.). Mas nesse item o Brasil é enormemente deficitário. Resultado: frustração, desesperança, ódio, sensação de impotência e indignação, que são os ingredientes necessários para desmoronar qualquer país decadente e socialmente retrocessivo, sobretudo depois da democratização do acesso às redes sociais. O Brasil se tornou extremamente complexo, porque socialmente muito doente (desigual) e moralmente parasitário (degenerado). É uma bomba-relógio de efeito não retardado! Suas crises de febre já são e serão mais ainda muito frequentes. A conta está chegando!

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